O Caminho da Graça para Todos





Sumário




1. Agradecimento e Apresentação 
2. Introdução: O Caminho da Graça para todos 
3. A Graça é a Lei do Caminho 
4. A liberdade de ser no Caminho 
5. A loucura da Cruz e o escândalo da Graça 
6. O Caminho da experiência comunitária, segundo Jesus 
7. O Encontro no Caminho 
8. O Caminho versus a instituição 
9. Conclusão: A Esperança como Caminho
10. Apêndice: O Evangelho nas Escrituras e as Escrituras no Evangelho 











Agradecimento e Afirmação de Propósitos Deste Material Este material foi gerado a partir de textos de meu site - www.caiofabio.com - e foi organizado pelo meu companheiro de Caminho, Marcelo Quintela, que é o mentor espiritual da Estação do Caminho em Santos / SP. Portanto, acima de tudo, quero agradecer ao Marcelo por ter organizado este trabalho, que esperamos servir de base de consciência para todos os que desejam caminhar junto com aqueles que entenderam o Evangelho como Comunidade no Caminho. Nele, Caio Fábio












Apresentação Antes de qualquer coisa quero dizer, em nome de Jesus, que sendo um pecador dentre todos os pecadores da Terra, nem por isso posso negar que Deus habita em mim, e que Dele recebo a Luz. Dou a conhecer aos meus amados irmãos que encontrei e conheço a nosso Senhor Jesus Cristo—Deus Conosco—, a Quem o Pai constituiu como meu Salvador por Sua exclusiva Graça, hoje e para todo o sempre. O conteúdo a seguir é uma espécie de ―apresentação aos que chegam às Estação do Caminho da Graça. É fruto da necessidade de dar a conhecer em que se fundamenta nossa experiência de fé pessoal e comunitária na Terra, na expectativa de confrontar mentalidades distorcidas e gerar alegria e força no coração de quem ganhou a convicção interior da Boa Nova em Cristo. Boa Leitura!




Introdução: O Caminho da Graça para Todos


“Portanto, irmãos, temos plena confiança para entrar no Santo dos Santos pelo sangue de Jesus, por um novo e vivo caminho que ele nos abriu por meio do véu, isto é , do seu corpo.” (Hebreus 10.20)

A Graça de Deus em Cristo não se resume a uma doutrina, não é uma teologia, não é um fundamento bíblico para ser assimilado intelectualmente, não é mera aglutinação de conhecimento teórico. Não. Pensar a Graça com essas categorias nada traduz acerca do Evangelho. Podemos até conceituar o Amor Incondicional de Deus, mas esse amor só será “aprendido” se for experimentado!

Portanto, a Graça é dom de Deus, recebido pela fé (que também é Graça, pois é fruto do trabalho do Espírito Santo na consciência humana), pela revelação da Verdade, que é Cristo Jesus: o Cordeiro sacrificado na eternidade pela culpa de toda criação, antes mesmo que houvesse mundo. Ele se manifestou através da Sua encarnação, morte, ressurreição e ascensão acima de todas as coisas; e, foi Ele quem estabeleceu que por Sua Graça se pode ter Vida, tanto nessa existência como na Eternidade!

Desse modo, saiba-se que a Graça é tudo e tudo é Graça!

Nenhum passo rumo a qualquer maturidade espiritual pode ser dado senão no caminho dessa Graça.

Já está evidente que a vida dita “cristã” que acontece fora do chão da Graça de Deus só gera doenças espirituais, psicológicas e existenciais. Gera religião, mas não sedimenta a paz de Deus. Gera mudanças comportamentais, mas não renova o homem interior. Pode gerar novos hábitos, mas não assegura um novo coração.

Paulo é o grande apóstolo da Graça. Das 155 referências do Novo Testamento à graça, 133 são dele. A Graça abre as suas epístolas, a Graça as conclui, e a Graça é a nota principal de tudo entre o começo e o fim. O termo “graça” provém do latim “gratia”, que é tradução de “charis”, em grego, que significa graciosidade, benevolência, favor ou bondade.

Paulo coloca charis com o significado de favor livremente concedido, empregando o termo especialmente para se referir ao que Deus fez por nós em Jesus Cristo e por meio dele.
Poderíamos dizer que graça é o amor de Deus agindo em nosso favor, dando-nos livremente o seu perdão e a sua aceitação, de uma vez por todas.

“Onde abundou o pecado, superabundou a graça” Romanos 5:20






A Graça é a Lei do Caminho


“… Pela Graça sois salvos, por meio da fé, e isso não vem de vós, é Dom de Deus, não vem de obras, para que ninguém se glorie!” (Efésios 2:8-9):

A Graça e somente a Graça É e sempre será a base do nosso relacionamento com Deus.
Todavia, os cristãos se convertem a Jesus num dia, e no dia seguinte bancam sozinhos as transformações que julgam serem decorrentes dessa conversão. Chamam isso de Santidade pessoal.

Porém, santidade pessoal é fruto da entrega ao Amor Incondicional do Pai, e não uma nova base. Se há Graça, então, também há santidade, que é o fruto do Espírito em nós: “Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne.”

Não há qualquer nova base de crescimento sobre a qual se constrói uma vida espiritual vitoriosa, pois tal esforço produz a obsessão de vencer por conta própria “o pecado que habita em mim”, segundo Paulo. E então a certeza da culpa nos deita nos braços do pecado. E não podendo sair desse ciclo infeliz, o cristão opta pela hipocrisia para aceitação no meio ‘santo’, opta pela performance para se destacar nesse meio, e prefere obedecer uma lista de regulamentos comportamentais para que fique ‘quite’ com sua consciência religiosa, que é pagã, ameninada, orgulhosa e meritória, por ser toda fundamentada em Justiça Própria.

A Lei da Graça inverte os pólos da Ética Religiosa: é o Descanso da Fé que desemboca na Obediência Amorosa, e não a obediência que gera o descanso. Tal obediência a Deus se expressa como resposta de gratidão daquele que recebeu consciência do amor de Deus: “Quem me ama, guarda os meus mandamentos; assim como eu amo o Pai e guardo os Seus mandamentos. E os mandamentos, são um: que vos amais uns aos outros, assim como eu vos amei.”

Uma vez interiorizada, a Conversão remove uma montanha infindável de culpas que foram abolidas em Cristo; não só as culpas decorrentes das ações praticadas, mas a culpa própria da minha essencialidade, porque eu sou pecador por natureza. Sendo assim, o Pecado que está abolido é o que eu sou, e não só o que eu faço, e até aquelas coisas que eu faço quanto mais culpa delas carrego, diminuem seu potencial destrutivo sobre mim, até findarem-se! Porém, essa inclinação do espírito só se inicia quando a pessoa se encontra em paz! Sem o peso da condenação, as compulsões começam a mudar de inclinação, surgindo – pela confiança, que vem da certeza em fé, de que está tudo pago – um outro pendor. Mas só se alcança isto quando se crê que a condenação acabou para sempre, na Cruz de Cristo.

Assim, santidade vem de sentir-se em paz na Graça, quando entendo pela FÉ que o que sou em Cristo, é o que vale; isto para que eu posso ir sendo…à medida em que cresço. Portanto, santificação é o apelido do crescimento da consciência na Graça dentro de nós.

Por que isso parece diferente do que chamamos santidade no meio cristão?

Porque nossa visão de santificação não é bíblica, é pagã e cheia de justiça própria. Sim, o que chamamos de santificação é exatamente aquilo que os fariseus ensinavam: ser zeloso da lei ou da lista, baseada em aparências e esforços próprios. “Santo”, para Jesus, é aquele que não julga o próximo; que anda mais de uma milha com o inimigo; que dá a capa para cobrir o frio do adversário; que não passa ao largo quando vê um homem caído na estrada; que dá água com amor aos irmãos… como se fosse o próprio Jesus quem bebesse; que veste o nu, abriga o órfão, acolhe o desamparado, abre a alma ao faminto, e não se esconde seu semelhante.

Sim, para ele, o santo é quem crê; é quem busca a verdade e a humildade.

Santidade, para Jesus, é simplicidade e gratidão. E, conforme Jesus, o santo é alguém livre para amar… Quanto mais santo se é, mais voltado se fica para o próximo e menos egoísta se torna o Ser. Por quê? Ora, porque aumentando a consciência na Graça, aumenta naquele que recebeu de Graça, a vontade de doar Graça.

E assim, a Graça opera a Lei do Amor: quem recebeu perdão, perdoa, quem recebeu graça, derrama graça, quem não foi julgado, porque Jesus foi julgado em seu lugar, esse tal não julga: “Perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos as nossos devedores.




A Liberdade de ‘Ser’ no Caminho


“Vinde a mim, todos vós que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei. Aprendei de mim, que Sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para vossas almas.”

A Graça é o convite de Deus a crescermos como gente ainda nesta vida. Veja: Quando meus filhos eram meninos, eu os tratava com lei, embora a graça do amor fosse a razão das regras. Mas à medida em que foram crescendo, e ia chegando o tempo dos ritos de passagem acontecerem – quando para cada um deles ficava implícito que o tempo da “tutela paterna” estava cessando – fui deixando-os mais livres, visto que a estação da “consciência própria” estava pronta para se abrir em frutos de auto-compreensão.

Paulo diz que a Lei foi um tutor, um escravo à serviço da infantilidade da consciência.

Quando porém veio a “plenitude dos tempos”— a idade para se ficar adulto —, Deus enviou o Seu Filho, e nos deu a Nova Aliança, a do Evangelho da Graça; a fim de que deixássemos de ser crianças em estado debilóide de tutela permanente, e nos tornássemos homens, com consciência própria. Essa é a Vontade de Deus: “nos tornar conforme Seu Filho Jesus Cristo!”

Em sendo assim, o grande ‘problema’ da Graça é a liberdade que ela gera. E liberdade é apavorante, nos deixa sem chão, dá vertigens na alma. Ninguém quer liberdade, porque ela nos obriga a andar com as próprias pernas, concede-nos a benção de pensar, sentir, discernir e nos julgar, nos fazendo profundamente auto-conscientes.

Consciência pressupõe a pré-existência de liberdade, e, esta só se manifesta em plenitude quando debaixo da Graça, pois somente nela que se perde o medo de ser, já que seja-lá-o-que-eu-for, “nenhuma condenação há”!

O problema é que a maioria das pessoas pensa que liberdade induz ao erro. Nenhum erro poderia ser maior! A Graça não é compatível com a entrega da vida à prática do pecado e da iniqüidade! Liberdade e Santidade não são antagônicas entre si:

“Continuaremos nós a pecar para que a Graça aumente?”

Santidade é saber viver todas as coisas lícitas, tendo o discernimento de saber o que convém e o que edifica. O santo viverá pela fé. Ou seja: em confiança não em si, mas na Graça. E toda conquista interior que lhe aconteça, não é mérito, mas Graça de Deus sobre ele; e sobre tais conquistas ele não fica alardeando com a boca, visto que, se são verdadeiras, elas serão percebidas pelo fruto da vida, em amor e misericórdia.

Portanto, o caminho da Graça não cria o espaço da libertinagem, mas tão somente o da liberdade de ser, sem os medos que decorrem das neuroses provocadas pela Lei ou pelas listas religiosas de-podes-e-não-podes.

O que os cristãos precisam saber é que Não há melhor lugar para conhecer nossa própria verdade, senão no solo seguro da Graça de Deus, onde não há mais condenação para os que estão em Cristo Jesus! Há somente aceitação e renovação! Primeiro se percebe tal qual se é; depois o Espírito promove seus frutos em nós, enchendo a vida de paz, alegria e amor.

Mas, paradoxalmente, os crentes têm medo de se enxergar como gente. Desse ponto em diante, a maioria dos cristãos confunde descanso e pacificação com vagabundagem existencial. Crescer em entendimento e experiência da Graça de Deus na presente existência, demanda de nós esforço, compromisso, e busca disciplinada de desenvolvimento interior, e que é fruto de auto-exame, e de auto-discernimento, tarefa que seria insuportável sem um coração pacificado pela Graça.

Então, para corresponder o quanto antes à norma massificada, as pessoas artificializam o agir de Deus, operando em si mesmas uma ‘transformação de ocasião’, uma conversão para fins eclesiásticos, uma supressão de tudo que choca a religião, uma espiritualidade ‘de fachada’, mas compatível com a média comunitária.

Essa falsificação do lavar regenerador e renovador do Espírito dá conta de instituir mudanças para fora do ser, exclusivamente comportamentalista, baseadas no fazer e mensuradas pelo desempenho, sem seu correspondente interior de crescimento na Graça e na Verdade. É a figueira sem frutos, mas adornada de folhagens, que camuflam a nudez própria do outono da vida.

No entanto, quando o cidadão se percebe assim, tendo Deus – em Sua misericórdia – permitido que ele caísse em si e, finalmente, olhasse para dentro, então o que acontece é que ele não se reconhece, e se assusta, se escandaliza, se choca, se culpa, se penitencia! Não sabe porque “depois de tanto tempo de evangelho” o que habita seu interior são as mesmas raivas, angústias e escravidões de outrora, mas agora travestidas de ‘santidade exterior’; existem os mesmos bichos vociferando rancores e preconceitos, só que agora legitimados pela interpretação adaptada da Bíblia, que nos dá a entender que somos seres superiores, triunfalistas, uma raça cheia de méritos em ser santa, um povo que se “acha!” por ser designado de propriedade exclusiva de Deus, sem qualquer compreensão que, em havendo tal eleição, ela é fruto de pura Graça, é anterior a nós mesmos, sendo anterior a qualquer coisa que tenhamos feito ou deixado de fazer, é anterior, inclusive, ao nosso próprio nascimento. Aliás, essa coisa toda é desígnio de Deus desde antes da fundação do mundo, quando o Cordeiro foi imolado para redenção de todo ser criado.

Portanto, no Caminho da Graça, não carregamos ilusões… não estamos esperando ninguém virar anjo, ninguém levitar a 10 cm do chão, ninguém ser levado pela carruagem de fogo da santidade que já não consegue viver no mundo. Ao contrário, posso afirmar que meu esforço pessoal é na tentativa de não me chocar com mais nada, posto que não há nada que você tenha feito que, ao menos em potencial, não exista em mim também. Não lidamos com robôs, nem com super-crentes ufanistas, nem nos interessamos por comportamentos performáticos só para dar a sensação de que tudo está sob controle na comunidade “vigiada”.

Diante disso, fica aqui declarado: Está suspenso o meu direito de me escandalizar com o que quer que seja verdade sobre você. Prefiro caminhar com você a partir de suas lutas e temores do que fingirmos que não trazemos essas coisas embutidas no cerne de nossas tribulações e dramas de vida.

O Caminho, portanto, está aberto a todos: Somos ‘devedores’ a homens, mulheres, adolescentes e jovens de todas as tribos; prostitutas, homossexuais, bissexuais e transexuais; fiscais de tributos, empresários, estudantes, políticos e donas de casa, ateus, católicos, espíritas e esotéricos, ricos e pobres, intelectuais e broncos, casados, descasados, solteiros, amasiados, juntados, separados, divorciados, viúvos… E a todos quantos se encontram carecidos da Glória de Deus porque não conhecem em seus corações a conversão que o Evangelho realiza por meio da fé, através da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo – único mediador entre Deus e os homens!






A Loucura da Cruz e o Escândalo da Graça – Para os Cristãos


A Graça é hoje a mais escandalosa de todas as mensagens cristãs! No entanto, a única mensagem que existe em Jesus é acerca da Graça eterna de Deus. E a loucura da Cruz não deveria ser louca para nós, nem fonte de escândalo, posto que a mensagem da Graça é todo o ensino e vida de Jesus. É a Boa-Nova! É o espírito do Evangelho! Dessa mensagem procedem todas as outras, pois toda manifestação cristã verdadeira sobre a Terra é a demonstração prática do amor de Deus aos homens. Se o amor é a mensagem ética por excelência, vivenciá-lo só será, de fato, possível por meio da conversão à Graça, na qual nós respondemos com amor Aquele que nos amou primeiro e de forma absoluta e incondicional. Não há Amor sem Graça. Não há Graça sem entrega ao Amor. Deus é Amor! E amor é o fruto da atuação do Espírito da Graça em nós.

Mas, incrivelmente, estranhamos a Graça de Jesus, nos assustamos com ela. Digo isso me referindo aos cristãos, de qualquer veia do Cristianismo.

E não havendo entrega radical à Graça, passamos a aceitar passivamente e engolir tudo que carrega a nomenclatura cristã, mesmo que de Cristo pouco possua, visto ter negociado Este que é o conteúdo mais intrínseco da Mensagem.

Quem, sinceramente, não percebe que nós, cristãos – somos hoje, na maior parte dos casos, a repetição dos mesmos conteúdos contra os quais Jesus, os profetas do Antigo Testamento, Paulo, os apóstolos e a Palavra se levantam nas Escrituras?

Hoje as pessoas se convertem à “igreja”, não à Cristo! É por esta razão que os conteúdos do Evangelho de Jesus estão tão adulterados entre nós. E pior: Parecemos estar com os sentidos embotados para esta percepção, de modo que o que hoje se vê é uma caricaturização de Jesus. O Jesus que nos foi apresentado é um “composer” do Jesus da “igreja”, o qual é moldado para ficar “parecido” com o grupo religioso ao qual a pessoa pertence. Portanto, o Jesus da fé da “igreja”, na maioria das vezes, é uma fabricação feita para validar as teses do grupo. E tal “Jesus” não faz nada de bom ou de mal que qualquer outro condicionamento mental, psicológico e cultural também não realize… A leitura do Evangelho que fazemos é uma “adaptação”. E é também “num Jesus de terceira ou quarta mão” que a maioria das pessoas crê.

Posso asseverar, com convicção e tristeza, que na igreja evangélica atual, primeiro o indivíduo tem que ser salvo do “Jesus inventado”… Primeiro precisa ser salvo do Jesus dos evangélicos a fim de conhecer o Jesus do Evangelho.

É exagero tal dedução? Então, permita-se a uma reflexão honesta: E se Paulo estivesse presente num ano eleitoral no Brasil? Se visse e soubesse de todas as negociações de almas-votos que são feitas em Nome de Jesus? E se assistisse pela televisão a venda de todos os significados cristãos em objetos de energia espiritual pagã? E se visitasse uma “igreja” e assistisse filas de pessoas para andarem sobre sal grosso, ou para mergulharem em águas tonificadas do Jordão e a passarem pela Cruz de Jesus a fim de ganharem um carro zero, como pagamento pela sua crença? E se ele soubesse agora que a fé é um sacrifício que se expressa como dízimos, como troca de bênçãos por dinheiro, de cura pelo sacrifício de longas novenas e correntes, que só não são “quebradas” se a pessoa não deixar de largar sempre algum dinheiro no altar-bolso dos pastores?

O que enojaria a Paulo, todavia, seria ver pastores oferecendo o “sangue do Cordeiro” –e que no caso é um suco de uva — e, segundo o anúncio, a pessoa deve ir ao templo e levar para casa o “sangue do Cordeiro” a fim de ungir a casa de trás para frente e da frente para trás. O “Sangue do Cordeiro’’ não é mais o que Jesus fez na Cruz, mas passou a ser um fetiche, uma regressão ao paganismo mais primitivo, uma mágica de bruxos, uma blasfêmia, um estelionato satânico dos símbolos de uma Verdade com a qual não se brinca impunemente.

Desse modo, Paulo veria aturdido o regresso da fé evangélica aos tempos dos cultos feitos a Baal, para as imagens de escultura, para um tempo onde nem sombra ainda havia das sombras das coisas que haviam de vir — coisas que, inclusive, perderam a simbolização em razão de Jesus haver sido o cumprimento de todas elas!

A carta aos Hebreus foi escrita por muito menos! O escritor de Hebreus diria que estão brincando com fogo ardente e consumidor e crucificando o Filho de Deus não apenas uma segunda vez, mas todos os dias — fazendo de Jesus um produto de barganha, fazendo do que foi feito por Ele, de Graça, de uma vez e para sempre, algo a ser vendido pelos camelôs do engano, em repetidos sacrifícios!

Meu Deus, e se… Paulo visse…!? Sim, se Paulo nos visitasse? Que epístola nos escreveria?

Ser evangélico para Paulo significava ter compromisso de fé e vida com o Evangelho de Jesus. Hoje, ser “evangélico” é pertencer a uma “igreja”, uma instituição religiosa que roubou o direito autoral do termo e se utiliza dele praticando um terrível “estelionato” simbólico.

Hoje, de maneira geral, quando um evangélico “evangeliza”, em geral, ele o faz a fim de que a “igreja” cresça como poder visível. Ou seja: “evangelização” significa crescimento numérico sob o pretexto de salvar as almas do inferno.

Quando Paulo evangelizava isto significava levar as pessoas à consciência da Graça salvadora de Jesus e da possibilidade da experiência da liberdade-salvadora, tanto na vida pessoal como também na comunitária. O resultado, portanto, não é o surgimento de um número a mais para as estatísticas celestiais, mas uma nova criatura que o Espírito da Graça, em Cristo, faz nascer no Novo Homem!

Desse modo, se Paulo estivesse vivo hoje, provavelmente, ele nos diria que nós ainda não somos convertidos, pois, voltamos atrás, e aderimos aos conteúdos que negam a Cruz de Cristo!

A doutrina do Purgatório é uma verdade existencial para todos os cristãos—incluindo os protestantes e evangélicos! E por quê? Ora, dizemo-nos “salvos” pela Graça, na chegada. Daí em diante, somos “santificados” pela Lei. Porém, tal “santificação” anula a Graça, segundo Gálatas 2.21, “pois, se a justiça vem pela Lei, Cristo morreu inutilmente!” Como “…se é pela GRAÇA, já não é mais pelas obras; se fosse, a GRAÇA já não seria GRAÇA”, (Romanos 11.6); então, ficamos num purgatório existencial sobre a Terra, pois, nem nos tornamos filhos da Graça a vida toda e nem nos entregamos aos rigores da Lei com honestidade. Desse modo, não usufruímos nem a saúde e a paz que vem da Graça e, tampouco, conseguimos viver pela Lei. Ou seja: vivemos em permanente estado de transgressão e culpa.

E quanto mais existimos nesse “purgatório”, mais orgulhosos, raivosos, arrogantes e mal-humorados nos tornamos, pois, no coração temos consciência de que não somos nem uma coisa nem outra: nem Gente da Graça e nem tampouco o Povo da Lei.

Então, nos tornamos os doentes que vendem cura! Nosso Cristianismo não se enxerga, não carrega nem os conteúdos do Evangelho e nem se parece com Jesus!

Jesus não veio ao mundo para criar um Circo, em alguns casos; uma Penitenciária, conforme outros casos; um Estado Soberano, conforme o Vaticano Católico e os “vaticaninhos” dos outros grupos cristãos; e, nem tampouco, um Hospício, como acontece em muitos casos!

Em Cristo não temos que ser pré-condicionados por nada que não seja o fundamento dos Apóstolos e Profetas, cuja Pedra Angular responde pelo nome histórico de Jesus, de Nazaré.
Quanto à igreja cristã, sabemos que ela não deixará de crescer em número e em poder terreno. Não. Seus templos estarão cheios e seu fervor religioso pode até aumentar, mas saiba-se que esse nosso Cristianismo não terá qualquer mensagem do Evangelho a pregar para as próximas gerações (com suas complexidades psicológicas e espirituais), a menos que se converta radicalmente à Graça (não como uma doutrina-teológico-moral), mas como a essência de nossa relação com Deus, o próximo e com o nosso próprio ser!

Nossa esperança é a possibilidade dele gerar consciências libertas do medo de ser e podendo experimentar a Graça de viver em Cristo, sem os temores que hoje são tão bem administrados pela “igreja”, na sua obsessão de ser a “conquistadora” do mundo e de seus poderes — incluindo almas humanas —; embora não ajude as pessoas a terem uma alma para gozar a vida em Deus e Deus na vida, ainda na Terra!




O Caminho da Experiência Comunitária, Segundo Jesus


O termo EKKLESIA sintetiza de forma impressionante o ser Igreja: São os chamados para fora. No entanto, na história cristã preponderou o caminho inverso, aquele que torna os discípulos em gente ‘chamada para dentro’, para deixar o mundo, para só considerarem ‘irmãos’ os membros do ‘clube santo’, e a não buscarem relacionamentos fora de tal ambiente. E nesse contexto, ironicamente, passamos a experimentar uma existência cada vez menos interiorizada, cada vez menos atenta para o que se dá no íntimo, e cada vez menos reflexiva.

Mas, lendo o Evangelho, é difícil conceber que Jesus sonhasse com aquilo que depois nós chamamos de ‘igreja’.

Quem pode ouvir o ensino de Jesus, com toda sua desinstalação, com toda a sua mobilidade, com toda ênfase na igualdade de todos, com toda denúncia aos poderes religiosos, e com toda a pertinência à vida — fosse para curar a mente, o corpo ou o espírito; fosse para anunciar a destruição do Templo como lugar de Deus; fosse para “beatificar” samaritanos e “demonizar” religiosos sem coração —; e, ainda assim, imaginar que Jesus tem qualquer coisa a ver com o que nós chamamos de “igreja”, seja aquela que se abriga no Vaticano, ou sejam aquelas que têm tantas sedes quantos pastores, bispos e apóstolos megalomaníacos existirem?

Não se vê Jesus tentando criar uma comunidade fixa e fechada, como também não percebo em Seu espírito qualquer interesse nesse tipo de reclusão comunitária.

Igreja, de acordo com Jesus, é comunhão de dois ou três… em Seu Nome… e em qualquer lugar… Igreja, de acordo com Jesus, é algo que acontece como encontro com Deus, com o próximo e com a vida… no ‘caminho’ do Caminho.

Para Jesus o lugar onde melhor e mais propriamente se deve buscar o discípulo é nas portas do inferno, no meio do mundo! Nesse Caminho, as maiores demonstrações de fé vêm de fora da religião. Percebe-se que tanto “malandros arrependidos” quanto “réus confessos” podem encontrar seu repouso.

Portanto, Seus discípulos são treinado a espalhar sementes, a salgar, a levar amor, a caminhar em bondade, e a sobreviver com dignidade no caminho, com todos os seus perigos e possibilidade (Lc 10). Com demônios, tempestades, interesses escusos, certezas satânicas, exageros desnecessários, familiares em pânico, medo de trair, frágeis certezas de jamais trair, traição explícita, negação e morte!

Mas, para além disso tudo, vê-se que no Caminho com Ele, os ventos cessam, as ondas se abrandam, as Leis fixas do universo são relativizadas, os demônios sabem quem Ele é e quem somos Nele!

Jesus é o Caminho em movimento nos caminhos da existência. E Seus discípulos são acompanhantes sem hierarquia entre eles. No mais… existem as multidões…, as quais Jesus organiza apenas uma vez, e isto a fim de multiplicar pães. De resto… elas vem e vão… ficam ou não… voltam ou nunca mais aparecem… gostam ou se escandalizam… maravilham-se ou acham duro o discurso… Mas Jesus nada faz para mudar isto. Ele apenas segue e ensina a Palavra, enquanto cura os que encontra.

Não! Jesus não pretendia que Seus discípulos fossem mais irmãos uns dos outros do que de todos os homens.

Não! Jesus não esperava que o sal da terra se confinasse a quatro dignas paredes de um Saleiro Comunitário.

Não! Jesus não deseja tirar ninguém do mundo, da vida, da sociedade, da terra… mas apenas deseja que sejamos livres do mal.

Não! Jesus não disse “Eu sou o Clube, a Doutrina e a Igreja; e ninguém vem ao Pai se não por mim”.

Assim, na igreja dos chamados para fora, caminha-se e encontra-se com o irmão de fé e também com o próximo que não tem fé… e todos são tratados com amor e simplicidade.

Em Jesus, o discípulo é apenas um homem que ganhou o entendimento do Reino e vive como seu cidadão, não numa ‘comunidade paralela’, mas no mundo real.




O Modelo do ‘Caminho’


O que será, então, que o Senhor tinha em mente quando disse aos seus discípulos que permanecessem em Jerusalém até que do alto fossem revestidos de poder?

O que sei é que Jesus esperava que tudo quanto Ele havia dito antes acerca de como se deveria proceder, de cidade em cidade, fosse agora vivido como uma ação contínua, num fluxo ininterrupto, num vai e vem constante, e como um poder que nunca tivesse um trono, nem uma cidade santa, nem um vaticano.

O que os cristãos precisam saber é que Jesus não era cristão, e que nem tampouco quis Ele fundar o Cristianismo, nem mesmo teve interesse em algo que se assemelhasse à civilização cristã, conforme nós a conhecemos de 332 de nossa era até hoje.

Jesus criou o caminho da fé na graça e no amor de Deus, o que deveria ser algo livre como o vento, e vivo e móvel como a água, algo muito, mais muito longe de uma proposta religiosa.

Tudo o que Jesus queria era que os discípulos continuassem discípulos, e que os apóstolos fossem os servos de todos; sem haver nem alguém maior, e muito menos, um lugar mais santo ou um centro de poder.

Jesus esperava que o poder do Espírito os fizesse sair em desassombro pelo mundo, pregando a Palavra da Boa Nova, ensinando singelamente os discípulos a serem de Jesus em suas próprias casas e culturas. Desse modo, se teria sempre um movimento hebreu, crescente, progressivo, livre, guiado pelo Espírito, e complemente semelhante ao que eles haviam vivido com Jesus durante o Caminho, naqueles três anos de estrada que construíram o Evangelho ao ar livre, nas praias da Galiléia, nos desertos da Judéia, nas passagens por Samaria, nas terras de Decápolis, e nos confins da Terra.

Alguém, com razão, diria que tal projeto não seria possível, visto que ninguém consegue viver sem um centro de poder. Entretanto, parece que ainda não se discerniu que o convite de Jesus é contrário a toda lógica de poder, e não propõe nada que não seja Hoje, e que não obriga a ninguém a pavimentar o futuro de Deus na Terra mediante a construção de alguma coisa duradoura.

Para Jesus, o duradouro era justamente aquilo que não se poderia pegar, nem fixar, nem pontuar, nem ser objeto de visitas turísticas, dada a sua impermanência num chão marcado pelas urinas dos mandões. Ele esperava que os discípulos fossem como o Mestre, e que aqueles anos de Caminho não ficassem cristalizados nas páginas dos registros dos evangelhos, mas que se tornassem um modo de ser de seus discípulos.

O poder dos discípulos, paradoxalmente, está em não ter poder. E o convite para que se morra a fim que se tenha vida, é também válido para a igreja, que – ao contrário do discípulo – quer mandar na vida, e controlar os homens e o mundo. Assim, pretendendo salvar a sua vida neste mundo, a igreja não só perde a sua própria vida, mas deixa de ganhar o mundo.

O que Jesus queria era uma multidão de seres-sal-e-luz se espalhando pela terra, e, se diluindo em sabores e luzes que só seriam sentidas, mas jamais se tornando uma Salina ou uma Usina de luz cristã, a serem visitadas pelos curiosos.

O reino é como o fermento escondido… até que pervade toda a massa da humanidade… sem ninguém saber como… e sem que ninguém possa dar glória a mais ninguém, se não ao Pai que está nos céus.

Aliás, a proposta de Jesus é tão extraordinária, que a vontade de aparecer não pode resisti-la. O sal, por exemplo, foi usado por Jesus como metáfora desse ‘desaparecimento’ da igreja na terra. Tudo ao que Ele associa a metáfora do sal é ao sabor, e nada mais. O sal tem que ter sabor, se não já não presta para nada. E para que o sal salgue e dê sabor, de fato, ele tem que se dissolver nos elementos que recebem o seu benefício. O sal só salga quando morre como sal visível e se torna apenas gosto, presença, tempero, realidade e benefício, embora ninguém possa dizer onde ele está, podendo apenas dizer: ele está na panela. Mas onde?

Já a Luz do mundo — vós sois! —, deveria ser a ação contínua da bondade e da misericórdia, de modo discreto, porém pleno de efetividade; de tal modo que os “de fora”, que ao receberem os benefícios da luz, podem discerni-la como boas obras, e assim, eles mesmos, agradeçam a Deus pelos filhos da misericórdia que Ele espalhou pela terra.

O que Jesus propõe como simplicidade total, entretanto, logo deu lugar às complexidades regimentais e aos centros de poder. Mesmo dizendo “tal não é entre vós”— referindo ao poder de governar dos reis e autoridades —, o que se criou desde bem logo foi aquilo que era comum, não o que era completamente incomum.

Na realidade, quem entendeu o Evangelho e seu significado, sabe que o Cristianismo se tornou uma perversão da proposta de Cristo, transformando o Evangelho puro e simples numa religião, com Dogmas, doutrinas, usos, costumes, tradições com poder de imutabilidade e muita barganha com os homens, em franca e pagã manipulação do nome de Deus.
No Cristianismo, Deus tem Seus representantes fixos e certos na terra—o clero, seja ele Católico ou Protestante—, tem Suas doutrinas e Dogmas escritos por concílios de homens patrocinados por reis, e tem na sabedoria deste mundo seu instrumento de elaboração de Deus: a teologia.

Desse modo, no Cristianismo, “Deus” não passa de uma ‘potestade religiosa’ e de um poder mantido pelos homens, posto que se crê que sem o Cristianismo, Deus está perdido no mundo.
O mundo conheceu o Cristianismo, mas não teve muita chance de conhecer o Evangelho, conforme Jesus e segundo as dinâmicas livres e libertadoras do caminho, de acordo com as narrativas dos evangelhos, nas quais o único convite que existe é para se “seguir” a Jesus.

O Brasil, por exemplo, está cheio de Cristianismo, e, paradoxalmente, morto do Evangelho.




O Caminho Não É uma Reforma!


Mas e a Reforma? Para quê serviu, então? Qual o fruto dela, hoje?

Talvez não seja a hora de propor uma Nova Reforma, tal qual alguns tem idealizado?

Não. Uma Nova Reforma é ainda “remendo de pano novo em veste velha”.

Buscar reformar o Cristianismo nada muda, visto que apenas se adia o comprometimento radical que o Evangelho demanda.

O Evangelho não propõe uma religião, mas o Caminho.

A Reforma Protestante elegeu de 95 teses; arrancou os ídolos do lugar do culto, e os retirou da devoção dos fiéis; aboliu o papado, acabou com boa parte do clero conforme a formatação católica, e afirmou que a Graça, Cristo, a Escritura e a Fé eram os ‘pilares’ sobre os quais a “igreja” deveria ter seus fundamentos. No entanto, a Reforma não se viu livre das técnicas gregas de ‘fazer teologia’ e suas sistemáticas, e nem abriu mão do logicismo grego, antes utilizando-se dele a fim de criar seus próprios credos, dogmas, doutrinas e leis morais. A Reforma é um Catolicismo que fez Dieta.

De fato, a coragem que se demanda desta geração é bem maior do que aquela que fez com que camponeses oprimidos pelo papado de Roma tiveram que ter a fim de iniciar a Reforma. Digo isto porque ‘ali’ a mudança não era radical.

O Evangelho permaneceu ‘aprisionado’ à Religião, e a coragem revolucionária que Ele demanda para se viver o processo contínuo de conversão e de não-conformação com este mundo, é aquela que se lança ao vento e caminha pela fé.




A Doce Revolução do Evangelho: Uma Desconstrução!


Diferente de uma reforma, cremos numa Revolução do Evangelho, a qual, só incluirá os cristãos se eles tiverem a coragem de desistir do Cristianismo e abraçar o supremo, porém, seguro risco de apenas andar conforme a revelação da Graça de Deus em Cristo, pela Fé.

A Revolução do Evangelho não se atém a nenhuma preocupação com construção de nada. De fato, o grande problema sempre teve a ver com a necessidade de segurança que as pessoas dizem precisar — o que a religião ficticiamente oferece —; e que as impede de apenas andarem pela fé no que Jesus já fez e consumou por todos os homens.

Assim, o que se exige é coragem para a desconstrução, visto que a promessa é que o próprio Espírito sempre haverá de nos conduzir a toda a verdade.

Se queremos algo de verdade e sério, temos que saber que isso demandará de nós uma volta humilde e sem tradições para a Palavra, isso a fim de sermos completamente lavados das tinturas com as quais o Cristianismo pintou a fé para nós.

Sei que o que digo é verdade segundo o Evangelho, mas também sei que tal fé é incompreensível pelas mentes viciadas no Cristianismo como Religião; e sei que é desinstaladora demais para aqueles que vivem do negócio clerical cristão.

O que creio, portanto, é que há um Basta de Deus em processo de eco no ar… O reino é Dele. A Igreja é Dele. O Povo é Dele. E Ele mesmo haverá de nos surpreender.

Quem, porém, desejar o Novo, então, se quiser ajudar, que não faça mais nenhuma barganha com a religião cristã, e, em contrapartida, que se entregue de coração ao Evangelho de Jesus, e que viva conforme a simplicidade da fé que confia que ‘tudo está feito’, e que não sobrou tarefa complementar e vicária a ser realizada por mais ninguém, nem pela igreja.

Desse modo, sei que sou uma voz solitária no deserto. Aliás, no que diz respeito a dizer o que digo, outros também o dizem, a diferença é que esses tais, em sua maioria, nada fazem.

Mas, na hora em que milhares e milhões que assim crerem passarem a viver livres conforme o Evangelho, então, sem pai, sem mãe e sem fundador, a revolução se estabelecerá: Sem sede, sem geografia, sem dono, sem tutor, e sem reguladores da fé. Isso, todavia, só será real e genuíno se Jesus for tudo, e o espírito do Evangelho da Graça for a única lei da vida.




O Encontro no Caminho


O que estou dizendo? Que nada valeu a pena? É claro que não! O que estou dizendo é que o mundo ainda não acabou, e que a cada nova geração os discípulos de Jesus têm, outra vez, a chance de viver o Evangelho, simples e puro, leve e livre, dissolvido em sabores sentidos, mas sem sede física de poder, sem qualquer mandão entre nós.
O mundo não acabou e a luz do mundo pode brilhar no mundo, não como uma ação oficial da igreja, mas como fruto da bondade misericordiosa de cada discípulo que não queira ser um agente especial da igreja, mas apenas um filho do amor de Deus solto nesta terra.

E não nos reuniremos mais?—é a pergunta angustiada de alguns. É claro que nos reuniremos sempre. Mas tais encontros não visam centralizar as forças, organizar as ações de poder, coordenar a produção dos ‘frutos’ e ‘divinizar’ a visão e a pregação do ‘método’; mas apenas renovar as alegrias da fé e da esperança, fortalecer o amor, e devolver as pessoas à vida com a simplicidade do sal e da luz. Ou seja: com sabor e boas obras.

De minha parte quero apenas ver os discípulos de Jesus crescendo em vida com Deus, em amizade clara e respeito uns para com os outros, em saúde relacional na vida. Gente descomplicada e desviciada de ‘igreja’, e com liberdade de escolhas pessoais, conforme a consciência de cada um e segundo a Verdade Absoluta que nos molda a mente conforme Sua vontade.

O ‘ajuntamento’ que chamamos igreja deve ser esse encontro, essa estação, esse lugar de bom ânimo e adoração. O ideal é que tais encontros gerem amizade, e que pela amizade as pessoas se ajudem; mas não apenas em razão de um certo espírito maçônico-comunitário, conforme se vê… ou porque se deu alguma contribuição financeira no lugar.

A verdadeira igreja não tem sócios ou associados… Tem apenas gente que se reúne e ajuda a manter a tudo aquilo que promove a Palavra na Terra.

Portanto, não se trata de um movimento ‘sacerdotal’, intimista e fechado; mas sim de um andar profético, aberto e contínuo…

E a escolha que se tem que fazer é essa: ou se quer uma ‘comunidade’ que existe em função de si mesma, e para dentro; ou se tem um ‘caminho de discípulos’, e que se encontram, mas que não fazem do encontro a razão de ser da vida.

Ao meu ver, no dia em que prevalecer o modelo do ‘caminho’, conforme Jesus no Evangelho, a vida vai arrebentar em flores e frutos entre nós e no mundo a nossa volta; e as pessoas serão sempre muito mais humanas e sadias.

Mas se continuar a prevalecer o modelo de igreja tal qual aqui tem sido denunciado, não se terá jamais nada além do que se teve nesses últimos dois mil anos… Nada diferente disso!

E para isto… para esta coisa… não tenho mais nenhuma energia para doar. Mas para a vida como caminho, ofereço meu coração mais jovem do que nunca.




Para Onde Caminha O Caminho da Graça?


“O vento sopra onde quer, não sabes de onde vem, nem para onde vai. Assim, é todo o que é nascido do Espírito”

Essas palavras de Jesus parecem nos apavorar! E por quê? Porque ninguém quer ficar sem saber para onde vai… e ninguém quer confiar a vida a Deus, de fato. Por que você acha que videntes, profetizas futuristas, bruxos, astrólogos, e agoureiros têm tanto poder? Ora, é porque todo mundo quer saber o futuro! O justo, porém, viverá, a cada dia, apenas pela Fé!
A questão, no entanto, não é saber para onde se vai. A única coisa que interessa é a Quem estou seguindo. Ora, nesse caso, não se trata nem mesmo de buscar seguir algo visível, mas de se deixar levar pela leveza do intangível, sem medo, e com total confiança.

Hoje em dia ninguém quer seguir mais o Vento, se é que algum dia já se aceitou isto. Uma mente religiosamente estruturada acaba por tentar ‘sistematizar” o Vento, o Espírito, e a Vida.
O interessante é que Jesus é o Caminho, e seguí-lo é a própria certeza de para onde se está indo. No entanto, Ele chamou para Si mesmo o direito soberano de nos conduzir com o mistério do Vento; e cumpre a nós apenas seguir em verdade, pois o alvo da jornada é Vida no Pai.

“Vós sabeis o caminho…”— disse Jesus. Eles responderam: “Como saber para onde vais, sem saber caminho?” A resposta todos conhecem: “Eu sou o Caminho…ninguém ‘vem’ ao Pai se não por mim”.
Ora, é aqui que mora a angústia da alma religiosa. Depois de milênios de treinamento para pensar no Caminho como Conduta, em Verdade como Doutrina, e em Vida como Performance, quem ainda sabe intuir a simplicidade das palavras de Jesus?

E pior: depois de pensar o Caminho como um “projeto”, na Verdade como um “sistema”, e na Vida como um “modo de ser” conforme a religião, quem pode ainda entender o significado do chamado de Jesus?

E mais desgraçadamente ainda, eu pergunto: Depois de pensar no Caminho como o “Pacote da Salvação”, na Verdade como a “Certeza dos Crentes”, e na Vida como uma “Longínqua Eternidade”, quem consegue ainda discernir a concreta subjetividade do chamado de Jesus Hoje?

E só para concluir: Depois de anos confundindo o Caminho com uma “Estrada Institucional”, a Verdade com a “Teologia”, e a Vida com a “Disciplina da Igreja”, quem ainda pode apenas de leve perceber o convite de Jesus para seguí-Lo no Caminho, sendo levado pelo vento, andando em Verdade no ser, e experimentando a Vida na vida?

Não! A gente quer um mapa, um sistema, uma estratégia, um planejamento de curto, médio e longo prazos. A gente quer saber como acontecerá: Qual a estrutura que nos governará? Quais os sistemas que nos conduzirão? E quais os objetivos concretos a serem declarados?

E que organização terá?

Para mim, se discirno com alguma correção o Evangelho, o espírito é um outro. Jesus nunca organizou nada; a não ser chamar 12 para estarem mais próximos Dele; a multidão em grupos, a fim de repartir o pão; e enviou alguns antes Dele a fim de fazerem preparativos específicos. No mais, nada mais.

“Não andeis ansiosos”… quanto ao vosso ministério, pois a vida é mais que o ministério.
“Não vos preocupeis com o que haveis de falar, pois o Espírito vos concederá…”
“Eis que vos envio como ovelhas para o meio de lobos”…

E lhes deu NADA como armadura, exceto a simplicidade do poder que vem da Graça.

O que creio é que tudo o que diz respeito ao Evangelho que já surge com a pretensão de ser uma organização, já nasce moribundo. A vitalidade do Evangelho está em se deixar conduzir pelo Espírito, conforme a verdade da vida e a vida na verdade.

Portanto, para mim, o melhor governo é o menor possível; o melhor modo, é o mais simples; a melhor forma, é aquela que serve a vida; e melhor meio é aquele que vai sendo, com a leveza do vento.

Eu creio que a sabedoria do caminho é deixar que o vinho designe o odre; e deixar que o pano determine a melhor veste para ele. E mais: é saber que o vinho novo sempre haverá de demandar, a cada momento ou geração, o odre apropriado; e que a veste nova haverá de ser combinada com o feitio que lhe for próprio.

Assim, formas servem às essências, e não o contrário! Para andar no Caminho tem-se que desistir do modelo industrial, ou da montagem em série, ou da franquia, ou do modelo pré-fabricado, ou de toda fixidez de formas, com suas Constituições e Regimentos, sejam escritos ou subentendidos, que só servem para agarrar-se às paredes do visível, para aplicar fórmulas de sucesso ministerial conforme o Mundo, para instituir hierarquias engessadas e para nos proteger uns dos outros.

E não haverá formas e governos eclesiais?

Ora, ninguém que vive no tempo e no espaço pode crer que as formas sejam evitáveis. Nossa dimensão demanda alguma forma: tempo e espaço produzem formas.

Porém, quem deu forma aos mares, às montanhas, aos rios, às florestas, aos desertos, aos vales, e à vida?

Por que não se pode confiar que Quem fez isto em rocha, pedra, areia, poeira, vegetação, e todas as demais coisas, também pode dar forma ao que é também Sua criação no coração humano, conforme cada geração?

No que depender de mim o Caminho da Graça continuará a caminhar conforme a água. Alguém já viu a água ter algum problema com a forma? Não! A água se serve de todas as formas. As formas servem à água, não a água às formas!

O espírito da caminhada é a simplicidade. Há um só Pastor. Há um só Guia. Há um só Mestre. E a Ele, conforme os princípios do Evangelho, nós todos seguiremos.

Nossa segurança não está nas formas, mas na essência do Evangelho. Onde quer que esse espírito do Evangelho tenha prevalência, todas as boas formas lhe prestarão serviço; mas jamais se tornarão um fim em si mesmo. Serviu, serve; não serviu, então, já não serve. A única coisa que não serve mesmo é atrofiar a Palavra para que ela fique conforme a forma e a fôrma.

Por outro lado, quem precisa de uma forma apenas para garantir que ali as coisas sejam sérias? Será que o que é verdadeiro se faz verdadeiro pela forma? Quem escolhe se fica ou não com o filho pela cara? Ou não será que ficamos com o filho pela vida?

Ora, se um dia tivermos presbíteros, saiba: eles não serão fiscais da vida e nem senhores da doutrina, mas gente da misericórdia e da paz; se tivermos diáconos, saiba: eles não serão porteiros de reunião, mas pessoas que só serão servos se servos forem na vida. No entanto, muitas vezes, a melhor maneira de não matar a vida espontânea é não batizá-la de modo oficial.

Ora, poderíamos criar muitas e muitas formas de governo. Isto é simples. É obvio. E há muitas roupas de grife se oferecendo como modelo para a vestimenta do pano novo. Mas é disso que fujo. No que nos diz respeito, o Espírito conduzirá as coisas conforme a pertinência. E nisto, também, o justo terá que se alegrar na aventura da fé.

A questão do Caminho como lugar é simples: Por que a gente apenas não se reúne com alegria singela, não experimenta o amor que liberta, não goza o privilégio da simplicidade, não se alimenta da Palavra, e não volta à vida cheio das Boas Novas para contar ao mundo?

O fato é que a mentalidade da “igreja” sempre foi a de criar uma “sociedade paralela”, com todas as formas de governo secular (e hoje empresarial), a fim de que alguns sejam os donos do processo, os controladores do povo, os governadores de Deus, e os xerifes da santidade.

A “igreja” quer tirar as pessoas da vida e do mundo, criando um viveiro de doentes e arrogantes.
O Caminho do Evangelho, porém, não é assim! Não é! Nele as pessoas não fogem do mundo e nem da vida. Nele não tem que haver governadores e nem príncipes. Nele confia-se na Soberania de Jesus, e na efetividade de Seu poder. Nele, cada pessoa é uma testemunha no mundo, não um militante de um partido eclesiástico. É dessa mentalidade que quero estar longe!

E quanto ao futuro?

Ora, amigos de caminhada, se já não temo a morte, por que haverei de temer o futuro? O Senhor nos guiará se nós não tentarmos guiar o Senhor!

Onde vai dar esse caminho? Já deu no Pai. E nos conduzirá a cada dia no caminho da pacificação!
Pensem em Abraão, que saiu, e foi, sem saber para onde ia. Daí Deus ter considerado que ele era um amigo. A grande recompensa da confiança é a amizade de Deus.




O Caminho X A Instituição


Esse capítulo foi incluído aqui para desfazer a impressão que carregamos alguma espécie de fobia institucional, como se o simples fato de desviar-se da instituição promovesse o Evangelho. Não é esse o caso.

Toda instituição que existe para servir aos homens é boa e útil. Muitos ‘anônimos de Deus’ realizam o Caminho da Fé, mesmo dentro das instituições, conforme lhes é possível, atuando com toda boa consciência.

Porém, quando ela demanda que os homens existam para mantê-la e servi-la, então, ela se torna demoníaca e instrumento do congelamento das almas humanas.

Penso que uma instituição é sempre algo como o Sábado nas narrativas do Evangelho: pode ser dia de descanso ou pode ser dia de prisão e dia de juízo e morte. Tudo depende de como se vê as coisas. Assim como o Sábado foi feito para o homem e não o homem para o Sábado, assim também a instituição existe para servir o homem, e não o homem à instituição.

Ou seja: uma instituição só tem poder maléfico se os homens a servirem como algo que é superior à vida e a existência das pessoas. Quando é assim, até o Templo de Jerusalém vira morada de demônios.

Parece tudo muito simples de entender, mas a história mostra como o poder de perversão humana é facilmente exposto quando a instituição se instala em nós com I maiúsculo. É assim em todos os níveis sociológicos e, naquilo que nos interessa aqui, também é assim no cristianismo protestante do qual descendemos. Ora, isto vai das formalidades e das politicagens dos concílios, das convenções denominacionais e ministeriais, até as mais cretinas formas de perversidade, praticadas em nome de Jesus, e feitas de intrigas, tiranias, perseguições neuróticas, e invenções mirabolantes, que tiram a simplicidade do Evangelho, e pervertem o sentido de ser Evangélico.

Saibam todos: E por ter entregue a alma à “Instituição” e as instituições à gente sem alma, que a igreja carrega mazelas próprias desse estado de ser. A lei, o orgulho, a vaidade, o mercado, a vanglória, a fama, o culto à imagem, o comportamentalismo, a superficialidade, o formalismo, os ciúmes, a picaretagem, a fixação no controle das pessoas, as jogadas políticas, a venda de votos, as negociatas e a grotesca hipocrisia, tornaram os evangélicos insuportáveis até para os evangélicos mais sensíveis, mesmo os que não tiveram um encontro com Jesus, que é usado para seduzir as almas aflitas; mas substituído pela “cartilha da igreja”, tão logo aquele que Nele creu entre para o seus registros de membresia.

Portanto, duas coisas devem ficar claras:

que não é a instituição que tem o poder de matar as coisas, mas sim o coração que se deixar fixar pela instituição, fazendo da existência dela um fim em si mesmo.
Deus não tem compromisso com a manutenção de instituições que se entendem representantes de seus interesses na Terra. Não. Ele não veste as camisas de nossos times eclesiásticos e nem carrega o orgulho besta de pertencer a qualquer estrutura denominacional.

O evangelho de João registra a profundidade do problema com as seguintes palavras:

“Veio para os seus, mas os seus não o receberam, mas a todos quanto o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber: os que crêem no seu Nome.”

Pensemos: Se quando Ele veio para os que eram naturalmente “os Seus” na Terra (os judeus, descendentes da Promessa feita a Abraão), esses tais nem sequer o reconheceram, por acaso Deus manteve-se limitado a eles na manifestação histórica do Seu amor? Não. Aqueles que “O receberam” — os quais também Dele “receberam o poder de serem feitos filhos de Deus” — são vistos por João como sendo todo e qualquer ser humano que acolhe Jesus com a gratidão de quem “foi feito”, posto que “não era”. Assim esses são porque sabem que não mereciam terem se tornado.

Ou seja: quando quem era, creu que era tanto, que não poderia deixar de ser (o Israel histórico), então, não O reconheceu. E quando aqueles que não eram, passaram a ser, assim foi porque aceitaram a oferta da Graça como os que recebem aquilo que não merecem, porém crêem no poder da promessa a eles feita por Aquele que os chamou de filhos, por Sua livre vontade, e os tornou em pagãos que são feitos filhos de Abraão, e gentios que se tornam o Israel de Deus. Paulo trata disso chamando de um “enxerto” do galho da “oliveira brava” no caule da “oliveira natural”.

Desse modo, a Igreja de Jesus Cristo é feita dos que “O receberam” (não sendo naturalmente “os Seus”), os quais, por esta razão, não apenas receberam “o poder de serem feitos filhos de Deus”, mas também se tornaram “o Israel de Deus”, e contra Ela, as portas do inferno não resistirão.
Ora, o verdadeiro “Israel de Deus” é feito de gente que se vê como aqueles que não deveriam ser, pois, no momento em que julgam que são, e crêem que esse é um estado cristalizado, nesse mesmo momento, deixam de ser.

De modo que, fazendo um paralelo com o princípio do texto, os cristãos, supostamente “Seus”, – sejam católicos, ortodoxos, protestantes ou o que for – podem assumir, no tempo presente, a correspondência exata daquilo que os judeus significaram para o Evangelho no primeiro século.

Veja se não é assim: A religião prega que “os Seus” que não O recebem, são todos aqueles que ouvem a mensagem da “igreja” acerca de Jesus, e não O aceitam como Salvador; portanto, não aceitando também serem membros da “igreja”; decisão essa que se tornou na única prova real de que alguém pertence a Jesus (!?). De acordo com esse ponto de vista, fora da religião ninguém é feito filho de Deus! E quem não é membro está ‘desviado’ dos ‘caminhos do Senhor; posto que tais caminhos devem passar inevitavelmente pelo grupo religioso que julga ‘possuir’ a Deus!

É assim que a igreja pensa! Não é de outro modo!

E por carregar a pretensão orgulhosa de possuir um pedigree genético, tal instituição, sem saber, passa a fazer parte do grupo com potencial para “não o reconhecer” Hoje.

No Caminho da Graça, todavia, sabemos que Deus não é evangélico (e nem qualquer outra coisa) e que Seu compromisso no mundo não é com a religião. No Caminho da Graça, ninguém vai simplesmente virar ‘evangélico’ e todos serão estimulados a serem ‘Evangélicos’ naquilo que de mais simples e profundo tal definição possa incluir: Ser Evangélico é ser do Evangelho. É conhecer a Jesus no espírito, e conhecer o espírito do Evangelho, e, no poder e na liberdade no Espírito Santo, experimentar o Evangelho como supremo benefício para a vida.
Quem busca a renovação do entendimento conforme o Evangelho, esse é evangélico. Mas quem busca a conformação da mente à “igreja”, esse não é Evangélico.

Assim, sou evangélico porque sou do Evangelho. E não sou “evangélico” pela mesma razão.




Conclusão: A Esperança Como Caminho


Tendo dito tudo o que disse, eu sei que pareço insano para alguns, pretensioso para outros, ou ambas as coisas e mais algumas. Não nasci ontem. Conheço os mecanismos de poder dos quais a “igreja” se alimenta. E também sei que apenas um punhado mínimo de pessoas têm a coragem que o Evangelho do reino requer, que é a coragem para abrir mão do poder, e para liderar pela simplicidade, sem trono a nos acolher em honras.

Quem, no entanto, tiver tal coragem da simplicidade, esse conhecerá o significado de ser discípulo de Jesus no reino deste mundo, e que é o poder que nasce da fraqueza—que, aliás, é o único poder que Jesus quer ver sendo vivido pelos Seus discípulos.

Esse é o meu convite. Minha esperança é que pelo menos alguns poucos entendam e creiam.

E, assim, como Paulo, eu também me ponho de joelhos pelo futuro de nossas consciências e na esperança de que o Espírito ainda “converta os cristãos” à consciência da Graça, a fim de que, o que hoje chamamos de Cristianismo, seja ainda liberto do poder diabólico que o invadiu. Do contrário, talvez, o Senhor chame por outro nome o Seu povo; ou, mais provavelmente, por nome nenhum.

Com Paulo, todavia, também me ponho de joelhos, pois, em meu coração, amo a mesma realidade-humana-redimida que ele chamava de família de Deus:

“Por esta causa, me ponho de joelhos diante do Pai, de quem toma o nome toda família, tanto no céu como sobre a terra, para que, segundo a riqueza da sua glória, vos conceda que sejais fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior; e, assim, habite Cristo no vosso coração, pela fé, estando vós arraigados e alicerçados em amor, a fim de poderdes compreender, com todos os santos, qual é a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade e conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento, para que sejais tomados de toda a plenitude de Deus”.

“Ora, àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós, a ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as gerações, para todo o sempre. Amém!”.

Bem-vindo ao Caminho da Graça!




Apêndice: O Evangelho nas Escrituras e as Escrituras no Evangelho


Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos nossos pais, pelo profetas, nestes ULTIMOS DIAS, nos falou pelo FILHO, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo.
Hebreus 1.1-2

Durante todo o texto deste trabalho a expressão ‘espírito do Evangelho’ é freqüentemente utilizada. Porém, sem uma compreensão clara do que isso significa, todo o entendimento do que foi exposto pode ficar comprometido.

Jesus, a Chave que abre as Escrituras

Os evangelhos são narrativas históricas das ações e acontecimentos relacionados a Jesus, bem como de Suas Palavras. O Evangelho, todavia, é um espírito. Os evangelhos são o corpo. O Evangelho é o espírito no corpo.

Para muitos, os evangelhos são apenas narrativas. Para outros, eles são palavras inspiradas. Para muito mais gente ainda eles são apenas palavras mágicas. E para a maioria, eles são somente os quatro primeiros livros do Novo Testamento, sendo, portanto, parte da Bíblia Sagrada.

Todavia, o Evangelho é espírito e vida. Deus é espírito, e, portanto, Suas palavras são espírito e vida, pois carregam o poder da Verdade Absoluta e produz vida onde quer que chegue.

Para melhor entender, suponha que os evangelhos não tivessem sido escritos. Decerto, sabemos que ainda assim, haveria um Evangelho a ser anunciado até os confins da Terra como Boa Notícia, visto ser o Evangelho um espírito, e não um livro.

Assim, o espírito do Evangelho é só uma forma de expressar-se acerca da Essência da Palavra. É a Plenitude da Revelação. Trata-se da forma de interpretação bíblica que olha para Jesus Cristo como a Chave Hermenêutica dessa Revelação.

De modo algum se está dizendo aqui que só Jesus interessa na Bíblia, mas, por outro lado, nada interessa senão a partir Dele e nada é Palavra de Deus se não for compatível com Ele, por mais ‘bíblico’ que seja!

Portanto, Jesus – que é Deus Manifesto entre nós – abre as Escrituras para nós. Cristo é a síntese das Escrituras e o Espírito da Graça é o agente hermenêutico que me aproxima do texto com a fé de que encontrarei a Palavra.

É a partir daí, então, que se interpreta a Antiga Aliança, os Profetas e todo o Novo Testamento. Isso porque Ele é a Palavra! A Encarnação Absoluta Dela, o Verbo Vivo de Deus, cheio de Graça e Verdade! E as próprias palavras de Jesus só podem ser entendidas se tiverem sua concreção no Evangelho vivido por Jesus de Nazaré.

Veja o livro de Atos dos Apóstolos: é um livro de atos, de ações. Mas sabemos que os únicos atos absolutos e irretocáveis feitos na Terra são os Atos de Jesus. Portanto, há Evangelho em Atos, mas o Atos não é o Evangelho. Digo isto porque se os critérios de Jesus forem aplicados aos atos dos apóstolos, os próprios apóstolos seriam sempre relativizados. Quando lemos o Atos, não se lê o Evangelho da Graça — esse só está plenificado em Jesus —, mas a tentativa humana de começar a viver conforme a fé em Jesus. E, em tal processo, há acertos, erros, equívocos, ação do Espírito, infantilidades, ambigüidades, milagres, diferenças, medos, ousadias, coragem maravilhosas, dúvidas atrozes, e todas as demais coisas concernentes aos homens que vivem no Caminho. Assim, o livro dos Atos Apostólicos, é um livro de história, e não quer ser visto como o Evangelho.

A tentativa infantil de dizer que a igreja é o Corpo de Cristo – e logo, Cristo estava agindo como antes agira, só que agora em Seu Corpo Comunitário – é bela, mas não é verdadeira como valor absoluto. O Pedro que recebeu a revelação é o mesmo que recebeu a repreensão: Arreda Satanás (Mt 16).

Em Jesus está toda a revelação e toda a referência para se julgar e entender o que quer que pretenda ser canônico. Onde o ‘espírito do Evangelho’ está presente, aí há o que levar para a alma e para a vida. No mais, vejo registros históricos da infância da fé e da consciência permeando toda a Escritura.

O exercício não é difícil: Basta olhar para Jesus. Veja como Ele tratou a vida, as pessoas, a religião, os políticos, os pobres, os ricos, os doentes, os párias, os segregados, os esquecidos, os seres proibidos, os publicanos, as meretrizes, os santarrões, e tudo e todos.

Nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade, e Nele estão TODOS os tesouros da sabedoria e do conhecimento.

Ele é o resplendor da glória do Pai e a expressão EXATA do Seu Ser, sustentando todas as coisas pela Palavra de Seu poder!
Olhe para Ele, e tudo fica interpretado!

Jesus, a chave que abre o coração

“Perguntou-Lhe Pilatos: O que é a verdade?”

Ora, conquanto Jesus seja também uma informação histórica — afinal Ele existiu, e nós não estávamos lá quando isto aconteceu; razão pela qual dependemos completamente das descrições que os evangelhos fazem de Jesus a fim de melhor discernir seu espírito —, no entanto, o discernimento de Quem Ele era, só acontece como revelação de Deus no coração.

Não se enganem: a pessoa pode até confessar a Jesus como Senhor, mas fazer isto como crença religiosa, e não como o fruto de uma relação pessoal com Jesus.

A Verdade não existe como Explicação, mas tão somente como Encarnação. A Verdade se fez carne! É Alguém. A Verdade é uma Pessoa!
Por isso, a Verdade só pode ser vivida, não pensada. Todo pensamento acerca dela decorre da experiência. A Verdade não é objeto de prosa… O Jesus do Evangelho não é para ser aceito, mas para ser conhecido. A Verdade que vejo em Jesus–Encarnada Nele — eu mesmo tenho que conhecer na minha própria encarnação, que é o único estado de existência que eu tive até hoje.

Portanto, é preciso que cada um conheça Jesus e Sua Palavra, para si mesmo. É preciso de cada um aprenda a Ter sua própria consciência em fé, a fim de viver a Palavra por si mesmo.

Em resumo, a Encarnação é a chave hermenêutica do conhecimento bíblico, mas essa chave tem que abrir antes o meu coração. E isto só acontece no encontro entre a Verdade e a Vida. Ora, tal encontro só se dá no Caminho, e é a isso que chamamos Consciência do Evangelho.
Por isso, aproveito-me deste trabalho para propor um exercício pessoal libertador:

1) Quero convidá-lo a pegar os Evangelhos e relê-los. Leia-os como se fosse a primeira vez, e faça-o como se você nunca tivesse ouvido nenhuma interpretação deles.

A necessidade de escrever a mensagem de Jesus veio do afastamento cada vez maior da sua fonte histórica – o próprio Jesus de Nazaré (Lc 1,1-4; Jo 20,30-31). Em meados da década de 70, já não vivia a quase totalidade das “testemunhas oculares” que tinham visto o Senhor ressuscitado (Lc 1,2; 1 Cor 15,3-8). Esse distanciamento cronológico entre Jesus e as comunidades só poderia ser vencido pela palavra escrita. E assim se formaram as duas grandes coleções ou “corpus” das Cartas de Paulo e dos Evangelhos.

2) Depois, eu gostaria de enfatizar a necessidade de ler o Novo Testamento na ordem cronológica da mais provável seqüência de sua produção: 1 e 2 Tessalonicenses; Gálatas, 1 e 2 Coríntios, e Romanos; Colossenses, Filemom; Filipenses, 1 e 2 Timóteo e Tito; 1 Pedro; Marcos; Mateus; Hebreus; Lucas; Atos; as Cartas Universais; João 1,2 e 3 o evangelho de João, 2 Pedro; e Apocalipse.

Como alerta, devo dizer que o primeiro inimigo a ser vencido no estudo bíblico é o pré-condicionamento na interpretação.

Então, meu querido: Soda Cáustica na cabeça, uma boa chacoalhada, limpeza, e início de leitura pessoal e aberta para a Palavra e para o Espírito. Então você verá que começará a surgir o Jesus real das páginas do Evangelhos! Experimente!

Que a Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos!

Caio

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